PRAÇA JÚLIO PRESTES, Nº 16
01218 020 | SÃO PAULO - SP
+55 11 3367 9500
SEG A SEX – DAS 9h ÀS 18h
03
nov 2018
sábado 16h30 Ipê
Temporada Osesp: Stutzmann e Tamestit


Orquestra Sinfônica do Estado de São Paulo
Nathalie Stutzmann regente
Antoine Tamestit viola


Programação
Sujeita a
Alterações
Gioacchino ROSSINI
Guilherme Tell: Abertura
Johann Nepomuk HUMMEL
Potpourri (Fantasie) para Viola e Orquestra em sol menor, Op.94
Ludwig van BEETHOVEN
Sinfonia nº 7 em Lá Maior, Op. 92
INGRESSOS
  Entre R$ 50,00 e R$ 222,00
  SÁBADO 03/NOV/2018 16h30
Sala São Paulo
São Paulo-SP - Brasil

Falando de Música
Quem tem ingresso para o concerto da série sinfônica da temporada da Osesp pode chegar antes para ouvir uma aula em que são abordados, de forma descontraída e ilustrativa, aspectos estéticos das obras, biografia dos compositores e outras peculiaridades do programa que será apresentado em seguida.

Horário da palestra: uma hora antes do concerto.

Local: Salão Nobre ou conforme indicação.

Lotação: 250 lugares.

Notas de Programa

GIOACCHINO ROSSINI [1792-1868]
/150 ANOS DE MORTE
Guilherme Tell: Abertura [1824-9]
12 MIN


JOHANN NEPOMUK HUMMEL [1778-1837]
Potpourri (Fantasie) Para Viola e Orquestra em Sol Menor, Op.94 [1821]
20 MIN


/INTERVALO


LUDWIG VAN BEETHOVEN [1770-1827]
Sinfonia nº 7 em Lá Maior, Op.92 [1811-2]
- POCO SOSTENUTO. VIVACE
- ALLEGRETTO
- PRESTO
- ALLEGRO CON BRIO
36 MIN

 

Quando, em 1822, Beethoven e Rossini se encontraram pela primeira vez – na celebrada visita do italiano a Viena –, simbolicamente reuniram-se na mesma sala dois mundos diametralmente opostos: de um lado a tradição germânica da música instrumental e absoluta, de outro a tradição italiana da ópera, considerada pela primeira como música frívola. O  desentendimento era previsível: os dois mal conseguiram conversar (Beethoven, aos 51 anos, já estava praticamente surdo), e Rossini (que aos 30 anos já gozava de fama e sucesso) horrorizou-se com as condições insalubres da casa de Beethoven. O desconcerto culminou com a recomendação de Beethoven para que Rossini continuasse compondo apenas óperas bufas – conselho que o italiano não seguiu: dois anos depois ele começaria a trabalhar em Guilherme Tell, uma ópera séria de grandes proporções.

 

A emblemática anedota – epíteto do antagonismo entre duas correntes fundamentais da música no século xix, apontado por Dahlhaus (1) – mascara relações entre as obras desses compositores (2). Ambos partilharam visões de mundo de uma mesma época e, se Beethoven desdenhava da produção de Rossini – “um belo talento e belas melodias vendidas ao alqueire”, em suas palavras (3) –, este admirava suas sonatas para piano, seus quartetos e a Sinfonia nº 3 – Eroica. A influência de Beethoven está especialmente presente nas aberturas de Rossini, com a utilização de recursos composicionais semelhantes (4). O libreto de Guilherme Tell, aliás, baseia-se na obra homônima de Schiller (1759-1805) – mesmo autor da Ode À Alegria incorporada à Nona Sinfonia. É significativo que os dois compositores tenham silenciado à mesma época: Beethoven faleceu em 1827, enquanto Rossini compunha sua derradeira ópera – justamente, Guilherme Tell (ele então se aposentou como compositor, embora ainda fosse viver 39 anos).

 

O paradoxo da rivalidade e proximidade entre compositores contemporâneos também se expressa na relação entre Beethoven e Hummel. Johann Nepomuk Hummel (1778-1837) nasceu em Bratislava e despontou como criança prodígio. Dos oito aos dez anos morou com Mozart como seu pupilo, estudou com Haydn – que, recém-aposentado, o indicou como chefe de orquestra na corte de Esterházy –, e foi reconhecido como um dos compositores e pianistas virtuoses mais célebres da Alemanha, ocupando na maturidade o posto de mestre de capela de Weimar, outrora pertencente a J. S. Bach. Foi professor de Carl Maria von Weber, contribuiu para o reconhecimento do jovem Schubert, e sua música exerceu influência sobre Chopin e Liszt. Quando se fixou em Viena, no final do século xviii, Hummel passou a disputar com Beethoven, oito anos mais velho e já bem estabelecido, as atenções e favores do público. O estranhamento inicial entre os dois – avultado pelo casamento de Hummel com a cantora Elisabeth Röck, de quem Beethoven também era admirador – evoluiu para uma relação amistosa que se perpetuou até o leito de morte de Beethoven. Como confidenciaria depois a um aluno (5), Hummel reconhecia a intimidante genialidade do adversário e, talvez por isso, nunca tenha se arriscado a compor uma sinfonia. Sua obra situa-se na transição estilística do Classicismo para o Romantismo e, ironias à parte, também incorpora influências de Rossini.

 

ROSSINI
Guilherme Tell: Abertura

 

Em 1824, a reputação internacional de Rossini rendeu-lhe o cargo de diretor do Teatro Italiano de Paris. Guilherme Tell, iniciada nesse ano para a Ópera de Paris, é uma grand opéra – gênero francês de ópera séria com dimensões volumosas. Cantada em francês, ela narra o episódio da libertação da Suíça da pujança austríaca dos Habsburgo, no século xiv, liderada pelo herói (talvez mítico) do título – o tema ressoa os ecos Revolução Francesa, que a monarquia restabelecida procurava silenciar (é surpreendente que não a tenha censurado). Na celebrada abertura, Rossini evoca a paisagem dos Alpes em três momentos: o alvorecer, na introdução Andante; uma tempestade, em Allegro; e a calmaria após a tempestade, em outro Andante com melodias pastoris. O ápice acontece quando os trompetes anunciam a Marcha dos Soldados Suíços – o conhecido tema da cavalaria –, que avança em um crescendo patriótico.


HUMMEL
Potpourri (Fantasie) Para Viola e Orquestra em Sol Menor, Op.94

 

Dedicada a um amigo violista, a Potpourri (Fantasie) amalgama de forma livre melodias conhecidas de árias de Mozart – das óperas Don Giovanni e As Bodas de Fígaro – e Rossini – da ópera Tancredi. Embora a peça esteja oficialmente em Sol Menor, somente a introdução Grave ocorre nessa tonalidade, sendo Ré Maior a sonoridade preponderante dentre as surpreendentes modulações. A obra original foi por muito tempo obscurecida por uma versão reduzida e incompleta, que não fazia jus à riqueza de sua orquestração (6).


LUDWIG VAN BEETHOVEN
Sinfonia nº 7 em Lá Maior, Op.92

 

Composta em 1812, paralelamente à Oitava Sinfonia, a tempestuosa Sétima reverbera o pathos do recente encontro de Beethoven com sua misteriosa Amada Imortal – a mais intensa das paixões impossíveis do compositor – especialmente, talvez, no expressivo segundo movimento. Os marcantes ritmos de dança, presentes em toda a obra, mesclam-se a melodias folclóricas na maior sinfonia que Beethoven escrevera até então. A première, regida pelo compositor, foi um sucesso. No mesmo concerto, Beethoven estreou também uma obra menor, A Vitória de Wellington, composta sob encomenda por razões financeiras (7). Dentre os ilustres músicos que integraram a apoteótica orquestração, na seção rítmica estavam Hummel e ninguém menos que Meyerbeer, ícone da grand opéra, a quem Beethoven acusou de estar sempre atrasado no tempo.

 

 

1 DAHLHAUS, Carl. Nineteenth-Century Music. Berkeley: University of California Press, 1989.
2 MATTHEW, Nicholas & WALTON, Benjamin. The Invention of Beethoven and Rossini: Historiography, Analysis, Criticism. Cambridge & New York: Cambridge University Press, 2013.
3 SWAFFORD, Jan. Beethoven: angústia e triunfo. Barueri: Amarilys, 2017, p. 737.
4 BURNHAM, Scott. “Making Overtures”. In MATTHEW, Nicholas & WALTON, Benjamin. The Invention of Beethoven and Rossini: Historiography, Analysis, Criticism. Cambridge & New York: Cambridge University Press, 2013, p. 197-209.
5 Site The Hummel Project [www.jnhummel.info].
6 SHELLEY, Howard. Encarte do CD Hummel, do selo Chandos, gravado em 2004 por James Ehnes (violino e viola), Howard Shelley (piano e regência) e a orquestra de câmara London Mozart Players.
7 Beethoven perdera dois dos seus três patronos: o Príncipe Kinsky falecera em 1812, e o Príncipe Lobkowitz estava à beira da falência. Restava ao compositor apenas o apoio do Arquiduque Rudolph, que permaneceu seu principal benfeitor até o fim de sua vida (LOCKWOOD, Lewis. Beethoven’s  Symphonies: An Artistic Vision. New York & London: W. W. Norton).

 

JÚLIA TYGEL é pianista, compositora e professora
na Faculdade de Música Souza Lima e no
Ensino à Distância da UFSCar. É doutora em
Música pela USP, com estágio na City University
of New York como bolsista CAPES/Fulbright.


Leia o ensaio "A Era de Beethoven", de Arthur Nestrovski, aqui.


Leia um excerto do ensaio "Prefácio a Vida de Rossini", de Lorenzo Mammì, aqui.


Leia o ensaio "Signor Tambourossini", de Larry Wolff, aqui.